06 janeiro 2011

Escrever a Mão na Beira d'um Penhasco

desenho de Pontoelinha (PE)

ESCREVER A MÃO NA BEIRA D'UM PENHASCO



Beirava à loucura. Foi até a cozinha e bebeu água. Estava sedenta, uma breve linha d’água escorreu por entre os seios brancos e joviais. Sentiu-se um pouco aliviada e enquanto ouvia-se as goeladas d’água, acariciava com a mão esquerda o bico do seu mamilo direito.
Voltou ao seu quarto logo após ter ido ao banheiro. Arrumou o lençol e deitou-se. Virou para a parede, depois de fechar os olhos, sua visão se inundou de imagens, desejos e sentimentos que, a cada minuto, tornavam-se mais reais ao ponto de sentir arrepios.
Mexia-se muito e estava naquele momento imaginando o rapaz que sentara ao seu lado, no banco da igreja. Imaginava-o segurando sua mão, um breve namoro e por fim, casados. Imaginava como seria o seu brinquedo e que sensação teria em senti-lo entrando nela. Sua língua movia-se dentro de sua boca: um beijo, agora uma chupada. Em uma fração de segundos, o rapaz da igreja deu lugar à imagem do pastor. Tinha uma curiosidade monstruosa do que estaria por baixo daquele terno azul marinho e forçava imaginar, aquele homem que achava bonito, urinando em suas pernas. Estava descabelada, e a coberta cobria apenas uma de suas pernas. De olhos fechado para o teto, seus dedos percorriam seu corpo todo, e em suas pontas, havia um mágico poder capaz de propiciar profundos e anestésicos arrepios. Já não era mais surpresa o seu corpo molhado, mas se assustou quando achou que tivesse urinado na cama.
No dia seguinte, acordada e apressada pela sua mãe para não se atrasar, ficou um pouco triste ao abrir os olhos, porém, preferiu imaginar que seu homem já havia levantado muito cedo para o trabalho e deu um cheiro e um beijo no travesseiro.
Chegava até imaginar como seria ser amada por alguns dos seus professores, mas nada se comparava aos seus mais íntimos desejos que tornavam-se reais em algumas noites que pareciam ser intermináveis.
Loira, pele branca, magra e estatura média, Crêu era muito obediente aos seus pais e fazia questão de mostrar a todos o quanto era boa e o quanto era inocente. No entanto, ela mesma sabia que sua inocência vaporava-se em meio ao calor da sua imaginação que fervia sobre seus lençóis e molhava as pontas de seus dedos.
Sentada no banco detrás, voltavam de um culto, seu pai dirigia e sua mãe parecia não saber o que era silêncio. Observava seu pai pelas costas e reparava em todos os gestos que era preciso fazer para dirigir, trocar a marcha, pisar na embreagem, no freio, olhar pelo retrovisor e ao mesmo tempo conversar com ela e sua mãe. Observava o pé-do-cabelo bem feito, os ombros largos e sua voz rouca e autoritária e por alguns segundos veio a sua mente a imagem inventada do que seu pai guardaria dentro das calças.
Seu rosto corou-se, e envergonhada olhou para sua mãe cujo cabelo era liso, longo e de um castanho claro. Admirou os gestos delicados de sua mãe e orgulhou-se dela por ter bom gosto para homens. Seus pensamentos, de repente, tornaram-se pesados e aterrorizantes, seu medo do pecado fez com que olhasse para os carros à frente e desviasse seus pensamentos para o que precisava fazer quando chegasse em casa.
Jantaram todos juntos em volta da mesa, seu pai, sua mãe, seu irmão mais velho e uma amiga que viera para estudar juntas. Aquele pôr-do-sol foi cheio de risos, cochichos e algumas confissões de amigas.
_ Ah, não fale assim do seu irmão...
_ E por quê? – perguntou rindo.
_ Por nada, só não creio que ele seja igual a todos os outros homens...
_ E por que não? – ainda rindo.
_ Não sei, apenas acho que não.
_ Mas são todos iguais!
_ Crêu posso te fazer uma pergunta? – em tom de segredo
_ Faz.
_ Mas promete que não vai ficar com raiva de mim?
_ Talvez. Prometo vai.
_ E que não vai contar pra ninguém?
_ Fala logo, estou ficando curiosa.
_ Você já viu o seu irmão pelado? Como é? – cochichou.
_ Ah sua safada! Meu irmão! Então é por isso né – demonstra surpresa em meio a risos.
Crêu chegou a repreender sua amiga pelos pensamentos sórdidos e depois de conversas e da despedida da amiga e do sol. A noite apresentou-se para velar as casas e se tivesse sorte, o sono de alguns mortais que, por ventura, esquecem a janela aberta.
A noite estava quente, e quente estavam os pensamentos de Crêu. Temia por esses pensamentos porque sabia que eles o tiravam o sono. As imagens criadas pela suas fantasias eram claras e nítidas. Eram mais que sonhos de olhos abertos, eram verdades que não aconteceram.
A sua noite épica iniciou-se com a imagem da mãe acariciando o pai e logo depois imaginou ela mesma acariciando o pastor que lhe ensinava com um tom de voz pesado e um pouco prolongado como fazer as carícias e onde acariciar. Imaginou ser presa por um policial e questionou-se se Jesus estaria observando-a.
Suas fantasias pareciam mais correntes que a prendiam ao limite da ilusão e realização, do pecado e salvação. Sentia cala frios que a davam uma gratidão de ter nascido mulher e seus ensinamentos davam o peso do medo, da vergonha e da condenação que talvez pudesse ter.
Gemia, e seus dedos já possuíam vida própria. As imagens se tornavam cada vez mais reais dentro de seus sonhos e os arrepios eram os sinais de que nada estava errado. Imaginou uma fileira de quinze rapazes, todos nus com seus corpos balançando, seus pelos e seus olhares penetrantes de selvagens caçadores. Tinha em sua mente, cada detalhe dos corpos, e questionava-se porque alguns se recobriam e outros não.
Estavam todos prontos, suando, rindo e dizendo safadezas. Ela estava de joelhos enquanto faziam um circulo em sua volta. Alguém se agachou junto dela e ela sentiu um abraço quente e anestesiou-se com aquele arrepio. Sua fantasia cresceu ao ponto de estourar-se e tudo – as imagens, seus sonhos, seu sono – murchou. No dia seguinte, acordou disposta, mas sentia uma ponta fina de arrependimento e nem ela sabia o porquê.
Algumas semanas passaram-se e tudo se mantinha normal. Crêu conheceu um belo rapaz, e após a autorização de seu pai, começaram um namoro, no entanto, não respeitavam as regras impostas pelo pai dela e escondidos beijavam-se a quase engolirem-se, amassavam-se a sentir o inchaço pulsando.
Em meio à euforia, os dedos dele já colocaram seu instrumento para fora das calças e caminhavam pelo corpo dela. Ao sentir o dedo do seu amado a entrar-lhe, Crêu assustou-se e com um empurrão, afastou-se de seu namorado e ao demonstrar insatisfação em vê-lo sem vergonha, gritou que era moça de família e deu-o um forte tabefe no rosto.
Antes de entrar em casa, Crêu teve o cuidado para enxugar suas lágrimas para não perguntarem nada e no seu quarto, deitou-se de rosto para o teto, lembrou do que vira e de olhos fechados deixou os seus dedos adquirirem vida.

Samir S. Souza
Publicado no Recanto das Letras em 28/11/2010
Código do texto: T2641358



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